Ainda era tempo, e por isso colocou os pés no chão devagar,
se levantou um tanto quanto cambaleante e foi até o armário, colocou roupas
quentes e se olhou no espelho. Nos olhos um brilho quase que infantil. Tinha
sono, frio e sentia que dentro de si uma lacuna o chamava a sair naquela noite
chuvosa.
Não sentia nada além do frio, no peito um coração batia
forte quase que dominando todo o corpo. Durante o caminho algumas mulheres o
olhavam com certo ar de curiosidade, ele sorria aquele sorriso maldito, ele seguia a deslumbrar e ser deslumbrado. Ele
ainda era um menino carnal, áspero ao mesmo tempo em que suave, amargo ao mesmo
tempo em que doce.
Lembrara-se de quantas vezes pegara algumas dessas mulheres
pela cintura, pelas coxas, pela nuca, quantas vezes foi mais corpo, quantas
vezes foi mais instinto que coração. Mas naquela noite pegou o telefone e
pensou em ouvir uma voz que a muito não ouvia.
Malicioso ele olhou pra muitas dessas moças que passavam,
deu outro trago no cigarro, se manteve imponente, tinha um certo charme, assim
como todos esses meninos que são como ele. Ele sabia como ser tocado, ele sabia
como tocar os desejos mais sutis de algumas daquelas moças que entre uma chuva
e outra passavam a desfilar olhares, sorriso, coxas e decotes.
Eu nunca fui menino inocente, admito todas as minhas culpas
e dolos, admito a minha imprudência, jamais a minha negligência. O não fazer
nunca foi bem aceito nessas linhas tênues que eu sigo, entre o bom menino e o
moleque.
Hoje eu estive a contar estrelas e fazer juramentos, hoje eu
estive um tanto quanto aflito com o coração, e por isso resolvi escrever sobre
o menino que sou, sobre o menino que fui, sobre o menino que você, tão
negligente me deixou ser.
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