domingo, 14 de dezembro de 2025

Dezembro

Os dias passavam devagar naquele mês de dezembro, parecia fim de mundo, bem no fim de ano. Eu caminhava a passos trôpegos buscando silenciar os meus pensamentos sempre tão rápidos e confusos. Mas as palavras dela acamavam a minha alma, como um prelúdio de bons dias, em notas maiores e felizes. Como se ela estivesse logo ali, vestido floral e um sorriso enorme no rosto. Ela era um dia de sol.

Eu tinha perdido a noção do tempo, os dias eram escritos como em um enredo imprevisível, onde eu, tão certa do que fazia não sabia mais se era mocinha ou vilã da minha própria história. O nó na garganta, o caminhar cambaleante, a dor na alma. Mas tudo se desfazia frente a uma palavra dela, qualquer uma. Ela era tanta luz, que eu, se não estivesse sedenta poderia ficar cega.

Não me venha com dizeres da razão, eu não a tenho e nem faço questão de ter quando a olho nos olhos no final de um dia qualquer, ela é tudo o que eu quero sentir. Sentir e respirar, respirar e me manter viva.

Eu conheço meia dúzia de pessoas que amaram de tal forma, todas elas se juntaram aos ébrios e escreveram as melhores poesias que eu já li. E se for preciso eu me juntarei a eles, só para descrever o quanto ela me traz um sorriso largo e feliz no meio de qualquer caos. Eu me sento a mesa do inconsequentes, só para ver ela passar. E não me arrependo de nenhum gesto de amor que possa dar a ela. 

Eu conheço outra meia dúzia de poetas que adorariam ter a amado, só para que suas linhas fossem mais cheias da intensidade que ela traz para os dias. Eu conheço mais um milhão de corações que amariam dormir com ela no peito pelo menos uma vez, só para sentir o que é estar vivo de verdade. Ela é tudo isso e mais um pouco. Eu sou só uma súdita do seu amor.

Os olhos dela, cada dia de uma cor me intrigam, e eu só vivo a vontade de estar com ela por mais tempo, descobrir o que cada cor quer me dizer. Descobrir cada tom do humor dela em silêncio, apenas olhando nos olhos e contemplando a beleza da infinitude do universo que existe dentro dela. Queria eu morar dentro dos olhos dela, nos pensamentos mais doces e carnais que ela pode me oferecer.

Os dias passavam devagar naqueles dias de dezembro, e eu, eu só queria morar nos olhos dela.

domingo, 2 de novembro de 2025

Maio (Poema número 2)

Havia algo diferente naquele dia tão normal, eu pensei que talvez fosse só o frio que insistia em invadir um dia de maio, ou talvez a minha insistência em ver normalidade em dias frenéticos. E aquele era mais um.

No fim do dia eu me embriaguei da presença de pessoas que talvez só quisessem também o acalento do fim de uma sexta-feira qualquer, era necessário interromper o caos do cotidiano. E assim foi.

O caminho para casa era destino certo, quando ela cruzou em frente aos meus olhos e falou sobre mil coisas que me faziam parar, ela chamou a minha atenção no meio de uma tempestade. E eu parei para ouvir. Ela poderia ter sido alguém de um assunto qualquer, fim de noite, embriaguez. Eu costumo falar sobre profundidades nesses ambientes, mas ela era muito mais profunda que isso, ela era um oceano inteiro e então mergulhei.

O encontro das nossas almas aconteceu de uma forma tão repentina que eu poderia dar os louros ao acaso, mas ela é muito para tamanha banalidade. Os dias vieram e a cada dia eu descobria o quanto ela era tão igual a mim, e tão diferente. Uma cartomante certa feita me contou o óbvio e eu fingi surpresa, na verdade, eu já sabia.

Quantas complexidades podem caber na cabeça e no coração de uma mulher? Ela veio me responder todas essas perguntas de uma forma tão clara, que eu, fiel escrevedora de palavras urgentes parei para observar. Observar o quando aquela urgência era dita por ela, pausadamente, como quem elabora com minucias todas as camadas de intensidade que o universo pode me trazer. A dona da maior complexidade é clara nos dizeres e faz com que eles sejam auto explicativos. Pelo menos para mim.

Eu mergulhei nos olhos dela, como que em algum lugar desconhecido e encontrei tanto do que é familiar, o conforto de um lugar seguro vem com a intensidade da sede pela descoberta perene. Ela é encanto desde o primeiro olhar mas também é a vontade de viver o que é bonito, e eu posso jurar que ela consegue mesmo após os temporais arrancar de mim a visão da beleza em tudo.

É intrigante o que ela traz e a maneira de ser menina mulher o tempo todo. Às vezes andando tropega e tropeçando nos próprios sentimentos, como quem só veio ver o por do sol e acaba ficando para vê-lo nascer. Às vezes com a força de um vendaval, sabendo exatamente onde fica o chão que deseja pisar, como fazem as deusas, as sábias e as mulheres como ela (mesmo que essas definições pareçam um enorme pleonasmo).

Ela tem cheiro de paz, dia longo em meio as flores que ela mesma regou. Mas às vezes atravessa o dia, perdida em pensamentos desconsoantes que ela mesma criou. Ela é dona de si mesma, mesmo quando não acredita.

Não venha me dizer o mais do mesmo, meu amigo. Ela não tem nada a ver com as linhas que antes escrevemos, ela é todo o preludio, a escrita e as notas finais. E nem eu, escritora de palavras conclusivas seria capaz de concluí-la, ela está em constante construção e eu não teria essa prepotência.

Ontem eu caminhei por horas e horas tentando dar nome ao que ela causa em mim, e eu fui incapaz de concluir. Ela é sobre o que eu nunca vi, escrita em versos de uma canção bonita que nunca é iniciada em acordes menores, que não tem cadencias propositais, que é sempre tão natural quanto um dia de sol que acaba em tempestade, mas nunca em desastre.

Os olhos dela me trazem a imensidão de todas as coisas que eu ainda quero descobrir, ela mora dentro da minha mente e é capaz de concluir todos os meus pensamentos frenéticos, todos os meus ditos não ditos. Ela é tudo o que me interessa e mais um infinito de coisas que eu desconheço. Mas que eu quero conhecer.

Te escrevo essas palavras em um final de domingo tranquilo, sabendo que nem todos são. Mas que muito dessa paz foi trazida pelo amor, que eu sinto agora de peito quente. Eu, tão acostumada a cambalear e tropeçar no meu próprio coração tenho trazido ele no peito, cheio daquilo que eu antes desconhecia. As tuas palavras ecoam pela minha sala como um enorme mantra, e o teu cheiro, preso em mim me faz pensar bobagens, que eu quero compartilhar grudada na sua pele, em meios aos seus gemidos mais profundos. Eu te amo com a intensidade e o calor de um vulcão ao mesmo tempo em que quero te cuidar com a serenidade da brisa de uma manhã tranquila. Eu só preciso que você venha.

quinta-feira, 23 de outubro de 2025

Bússolas (Poema número 1)

Eu te vi atravessando a sala, sem medo algum dos meus tão temidos olhos escuros. Você nem pensou em como deveria agir. Só se vestiu de si mesma e se colocou no caminho, como quem sabe quem é.

Logo eu, tão dona das situações tive que me adequar ao seu imenso levar das palavras. As palavras sempre foram minhas. Quem te vestiu dessa prepotência? Quem disse que você podia?

Pois é! Você sempre pode!

Eu te conheci numa outra hora, olhares claros, fim de tarde. Uma outra existência! Não foi de hoje!

Eu escrevia meus ditos no jardim de sempre e você atravessou o meu olhar, tão a frente de nós. Eram novembros confusos, eu me guardava de mim. Você se atrevia ao mundo. Eu já te amava. Pois é, essa noite eu sonhei que fazem vidas. Eu já te amava, eu te quis em constante evolução.

Eu enlouqueci por dias, socando as paredes a cada amor seu que não era eu. Até que aprendi que eu não era o seu único fim, mas sim o teu norte. A bússola explicaria, as convenções jamais.

O que eu tinha pra ti era a infinidade e não as receitas do caminho. Nosso amor era tão grande que ele respeitava os meios sendo fim. Eu era a tua luz, você era o meu porto. Mas antes deles havia o caminho.

No caminho eu me inebriei em amores de todas as estações, estive entre sonhos, futuros e coxas. Elas me amaram também, eu mesmo amando todas elas já te amava. A nossa sentença era pré anunciada.

Eu não sabia seu nome nessa vaga existência, eu não sabia a cor dos teus cabelos. Eu te reconheceria em qualquer lugar. Até que naquele dia de maio, o meu bar favorito, tão fora de mim devido ao excesso de álcool ou a falta de controle, os meus antes tão temidos olhos escuros reconheceram os seus. Teriam reconhecido numa multidão.

Eu te amei antes, eu sigo te amando. Eu te amaria onde quer que nos encontrássemos. Eu estive te procurando mesmo sem saber, eu te busco em todo lugar.

Não se perca nas esquinas, mulher! O amor está ao teu lado e sabe onde te encontrar. Ele sabe muito sobre ti e há de te guiar até mim.

domingo, 17 de agosto de 2025

A hora.

Ela atravessou a sala, em um dia de sol. Havia já um certo tempo em que ela vinha sendo paciente e presente. Mais presente do que ele deixava que ela fosse.

Ela era afago e conforto, ela era tesão de um jeito motivado. Era tudo o que ele queria.

Ele andava atribulado por um amor de outra estação, mas naquele dia ela foi todas as estações. Ele a olhou nos olhos e ela o fez sorrir. Aquilo parecia deveras impossível.

Ela nunca foi embora, como num prato quente. Ela aguardou a hora exata de estar. Assim como fazem os grandes momentos, os grandes acontecimentos e os grandes amores.

Ofereceu a ele o que poderia dar, ele ofereceu a ela o espanto de encontrar em alguém tanta certeza e paciência. Ele, após os dias descobriu que era sobre amar.

Ela o beijou calmamente, depois de tanto tempo parecia que aquilo jamais aconteceria. Invadiu sua casa e arrancou dele o que de mais bonito havia. Ele respirou afoito e procurou nela o que se busca em um grande amor. Mergulhou em seus seios como quem quer se alimentar de intensidade e calor.

Ela sabia que certa hora seria poema, ela sempre soube. Ele era só um menino, ela era uma mulher. Mal sabia ele que ela conhecia o final da história melhor que ele mesmo.

O jeito que olhava profundamente nos olhos dele, o deixando nú desde o primeiro olhar, antes o amedrontava. E ele lembra das palavras dela " Eu quero te conhecer melhor que você mesmo, quero saber o que te faz feliz e os maiores medos que te afligem". Naquele dia ele entendeu que ela vinha fazendo isso dia após dia desde que se cruzaram pela primeira vez. Ele pela primeira vez estava completamente entregue a ela. 

Não me venha com meias palavras, menino assustado! Eu sei que estás todo amedrontado pelas dores de amores de todas as estações. Mas hoje fez um sol bonito, e você esteve sorrindo. Eu sei.

Ela atravessou o peito dele, fim de semana qualquer. Ela sabia o que fazia.

quarta-feira, 13 de agosto de 2025

Agosto.

Acordou pela manhã, ajeitou os cabelos e vestiu sua roupa favorita. Estava um pouco pensativo, mas vestiu também seu melhor sorriso. Era mais um dia banal, quarta-feira, presságios de solidão. Ele já sabia lidar bem com ela. 

Saiu de casa um pouco apressado, não havia nada com que se adiantar, mas era o jeito dele. Jogar tudo nos bolsos como se não houvesse mais onde colocar. Fazer tudo como se o mundo estivesse prestes a acabar. Estava no seu automático. O café tinha só gosto de café. Assim como as lágrimas às vezes são só salgadas mesmo. Não sentia nada que fosse diferente. Já tinham dias que ele estava assim.

Mas no meio de um caminhar compassado, sentiu ele no peito um descompasso. O coração saltitava quase que sem resposta do resto do corpo, ele cambaleou mais duas ou três esquinas e se encostou na parede de um prédio antigo, olhou para cima e se despediu de si mesmo. Será minha sina morrer no meio da rua, sem nenhum conhecido, sem nenhum afago?

Respirou fundo e passou a pensar nos dias que vinha tendo. Não fazia sentido nenhum aquele pesar tão forte a ponto de trazer medo. Nenhuma lembrança triste, nenhuma perda. Era só uma quarta-feira de agosto. Agosto.

Agosto parecia um mês tão frio, não só pela estação, mas frio mesmo. Sem nenhum acontecimento que lhe afagasse ou apertasse o peito, sem nenhum sentimento. Agosto para ele parecia segunda-feira de semana sem graça. Mas que dor era aquela agravada pelo vento gelado? 

Pois, é. É sobre a dor que retalha o peito mas fica escondida, entre os escombros do que escolhemos ser. O menino tentou gritar algumas vezes nos últimos meses, mas estava ali brincando de perfeição, amarrando o nó da gravata devagar mas sempre saindo desajeitado de casa. A pior dor pega a gente, quarta-feira de uma semana banal, no meio de agosto com uma desgosto tão óbvio.

Se ajeitou e voltou a andar, sem saber ao certo para onde ia, os sentimentos do mundo todo no bolso e o mesmo sorriso maldito de sempre. O menino bagunçou os cabelos e os pensamentos e voltou a caminhar.

terça-feira, 5 de agosto de 2025

Menino.

Vinha sendo sincero consigo mesmo. Estava em paz com consigo e com aquela que o habitava. Eram dias de luz.

Caminhou pelos seus próprios sentimentos e sabia. Só queria a intensidade de ser quem era.

Sabia que tudo o que viveu era necessário, inclusive a dor que o atravessou o peito outra noite dessas. Mas sabia que não era tudo.

Se olhou no espelho de manhã e sorriu. O menino do sorriso maldito havia voltado, caminhar de lado como quem carrega as dores do mundo e o sorriso de criança. Mesmo assim, ele estava feliz.

Saber quem era e onde pisava era importante, mas ele ainda era o mesmo de sempre. Apaixonado por dizeres, trejeitos. Coxas e sonhos, coisas de mulher. Ele jamais saberia conter.

Naquele momento parecia que o mundo notava sua existência. Eram amores de tantas estações lhe dando bom dia. Era tão fluente a sua presença. Elas estavam tão presentes, a maioria daquelas que ele um dia amou. E pela primeira vez ele pensou em olhar para trás.

Eram tão sábios os amores de outra estação.

Ele só seguiu em frente.

Talvez nem saiba onde quer chegar. Ele cuidou do próprio coração. Acordou mais cedo e fez surpresa aos seus amores fraternos. Abraçou os amigos e quis ser paz para eles.

O menino tinha outras prioridades. Mas queria ser feliz também nos braços de um amor.

Naquela manhã ele abraçou o mundo. Mas dormiu sonhando com um amor que pudesse vir o abraçar. 


terça-feira, 29 de julho de 2025

O despertar.

Parecia ter acordado de um porre, daqueles que a gente mal lembra dos acontecimentos. Tinha o corpo dormente e memória confusa, então se deitou novamente e esperou que a cabeça voltasse ao seu lugar.

Não entendia qual o tipo de encanto tinha o levado tão longe. Pela primeira vez ele não sabia. Mas sentia no estômago a necessidade da distância daqueles acontecimentos. Não faria bem revisitar aquela história, embora fosse tão recente.

Levantou tarde naquela manhã de inverno, sentia nas pernas o cansaço e no coração um vazio, que naquele dia fazia bem. Naquela manhã ele mesmo foi seu maior amor. 

O menino se olhou no espelho e se reconheceu, cuidou da casa, fez o café e o jantar. Se sentou sozinho em frente a TV com uma paz que há tempos não o atingia. Seria ele capaz de viver sem amar? Ele estava bem, não sabia por quanto tempo.

Se conhecia, sabia que em algum momento algum sorriso, algum par de penas ou algum balançar de cabelos iam o fazer brilhar os olhos, sacudir a alma, alimentar os escritos. Mas hoje não.

Hoje o menino caminhou entre seus escritos mais absurdos, mas não se deixou sujar da sangue. Ele sentia cada palavra que um dia disse, mas não chorava nenhuma delas. Ele só carregava no rosto um sorriso tranquilo. Não era desamor, era respiro. Ele estava feliz.

A solidão o acompanhou de mãos dadas e olhou profundamente dentro de seus olhos escuros. Ele não teve medo dela. Ele apenas sorriu.

Malditos os dizeres de alguns poetas que só viram beleza nas tristezas que escreveram. Não é só delas que nascem as intensidades. Ele era a intensidade! Mas também sabia sorrir feliz ao final de cada ciclo, depois que o coração parava de doer.

Naquele dia o poeta sabia que tinha pegado o coração no bolso e colocado no em seu lugar, e naquela noite de inverno ele estava quentinho, abrigado no peito.

Acordou no meio da noite, sem susto. Pegou a caneta e o papel para falar sobre a solitude que chagava de mansinho e cuidava dele, sabendo que talvez ela nem dure. Afinal, ele era o menino poeta, e meninos poetas nasceram para amar.