domingo, 17 de agosto de 2025

A hora.

Ela atravessou a sala, em um dia de sol. Havia já um certo tempo em que ela vinha sendo paciente e presente. Mais presente do que ele deixava que ela fosse.

Ela era afago e conforto, ela era tesão de um jeito motivado. Era tudo o que ele queria.

Ele andava atribulado por um amor de outra estação, mas naquele dia ela foi todas as estações. Ele a olhou nos olhos e ela o fez sorrir. Aquilo parecia deveras impossível.

Ela nunca foi embora, como num prato quente. Ela aguardou a hora exata de estar. Assim como fazem os grandes momentos, os grandes acontecimentos e os grandes amores.

Ofereceu a ele o que poderia dar, ele ofereceu a ela o espanto de encontrar em alguém tanta certeza e paciência. Ele, após os dias descobriu que era sobre amar.

Ela o beijou calmamente, depois de tanto tempo parecia que aquilo jamais aconteceria. Invadiu sua casa e arrancou dele o que de mais bonito havia. Ele respirou afoito e procurou nela o que se busca em um grande amor. Mergulhou em seus seios como quem quer se alimentar de intensidade e calor.

Ela sabia que certa hora seria poema, ela sempre soube. Ele era só um menino, ela era uma mulher. Mal sabia ele que ela conhecia o final da história melhor que ele mesmo.

O jeito que olhava profundamente nos olhos dele, o deixando nú desde o primeiro olhar, antes o amedrontava. E ele lembra das palavras dela " Eu quero te conhecer melhor que você mesmo, quero saber o que te faz feliz e os maiores medos que te afligem". Naquele dia ele entendeu que ela vinha fazendo isso dia após dia desde que se cruzaram pela primeira vez. Ele pela primeira vez estava completamente entregue a ela. 

Não me venha com meias palavras, menino assustado! Eu sei que estás todo amedrontado pelas dores de amores de todas as estações. Mas hoje fez um sol bonito, e você esteve sorrindo. Eu sei.

Ela atravessou o peito dele, fim de semana qualquer. Ela sabia o que fazia.

quarta-feira, 13 de agosto de 2025

Agosto.

Acordou pela manhã, ajeitou os cabelos e vestiu sua roupa favorita. Estava um pouco pensativo, mas vestiu também seu melhor sorriso. Era mais um dia banal, quarta-feira, presságios de solidão. Ele já sabia lidar bem com ela. 

Saiu de casa um pouco apressado, não havia nada com que se adiantar, mas era o jeito dele. Jogar tudo nos bolsos como se não houvesse mais onde colocar. Fazer tudo como se o mundo estivesse prestes a acabar. Estava no seu automático. O café tinha só gosto de café. Assim como as lágrimas às vezes são só salgadas mesmo. Não sentia nada que fosse diferente. Já tinham dias que ele estava assim.

Mas no meio de um caminhar compassado, sentiu ele no peito um descompasso. O coração saltitava quase que sem resposta do resto do corpo, ele cambaleou mais duas ou três esquinas e se encostou na parede de um prédio antigo, olhou para cima e se despediu de si mesmo. Será minha sina morrer no meio da rua, sem nenhum conhecido, sem nenhum afago?

Respirou fundo e passou a pensar nos dias que vinha tendo. Não fazia sentido nenhum aquele pesar tão forte a ponto de trazer medo. Nenhuma lembrança triste, nenhuma perda. Era só uma quarta-feira de agosto. Agosto.

Agosto parecia um mês tão frio, não só pela estação, mas frio mesmo. Sem nenhum acontecimento que lhe afagasse ou apertasse o peito, sem nenhum sentimento. Agosto para ele parecia segunda-feira de semana sem graça. Mas que dor era aquela agravada pelo vento gelado? 

Pois, é. É sobre a dor que retalha o peito mas fica escondida, entre os escombros do que escolhemos ser. O menino tentou gritar algumas vezes nos últimos meses, mas estava ali brincando de perfeição, amarrando o nó da gravata devagar mas sempre saindo desajeitado de casa. A pior dor pega a gente, quarta-feira de uma semana banal, no meio de agosto com uma desgosto tão óbvio.

Se ajeitou e voltou a andar, sem saber ao certo para onde ia, os sentimentos do mundo todo no bolso e o mesmo sorriso maldito de sempre. O menino bagunçou os cabelos e os pensamentos e voltou a caminhar.

terça-feira, 5 de agosto de 2025

Menino.

Vinha sendo sincero consigo mesmo. Estava em paz com consigo e com aquela que o habitava. Eram dias de luz.

Caminhou pelos seus próprios sentimentos e sabia. Só queria a intensidade de ser quem era.

Sabia que tudo o que viveu era necessário, inclusive a dor que o atravessou o peito outra noite dessas. Mas sabia que não era tudo.

Se olhou no espelho de manhã e sorriu. O menino do sorriso maldito havia voltado, caminhar de lado como quem carrega as dores do mundo e o sorriso de criança. Mesmo assim, ele estava feliz.

Saber quem era e onde pisava era importante, mas ele ainda era o mesmo de sempre. Apaixonado por dizeres, trejeitos. Coxas e sonhos, coisas de mulher. Ele jamais saberia conter.

Naquele momento parecia que o mundo notava sua existência. Eram amores de tantas estações lhe dando bom dia. Era tão fluente a sua presença. Elas estavam tão presentes, a maioria daquelas que ele um dia amou. E pela primeira vez ele pensou em olhar para trás.

Eram tão sábios os amores de outra estação.

Ele só seguiu em frente.

Talvez nem saiba onde quer chegar. Ele cuidou do próprio coração. Acordou mais cedo e fez surpresa aos seus amores fraternos. Abraçou os amigos e quis ser paz para eles.

O menino tinha outras prioridades. Mas queria ser feliz também nos braços de um amor.

Naquela manhã ele abraçou o mundo. Mas dormiu sonhando com um amor que pudesse vir o abraçar. 


terça-feira, 29 de julho de 2025

O despertar.

Parecia ter acordado de um porre, daqueles que a gente mal lembra dos acontecimentos. Tinha o corpo dormente e memória confusa, então se deitou novamente e esperou que a cabeça voltasse ao seu lugar.

Não entendia qual o tipo de encanto tinha o levado tão longe. Pela primeira vez ele não sabia. Mas sentia no estômago a necessidade da distância daqueles acontecimentos. Não faria bem revisitar aquela história, embora fosse tão recente.

Levantou tarde naquela manhã de inverno, sentia nas pernas o cansaço e no coração um vazio, que naquele dia fazia bem. Naquela manhã ele mesmo foi seu maior amor. 

O menino se olhou no espelho e se reconheceu, cuidou da casa, fez o café e o jantar. Se sentou sozinho em frente a TV com uma paz que há tempos não o atingia. Seria ele capaz de viver sem amar? Ele estava bem, não sabia por quanto tempo.

Se conhecia, sabia que em algum momento algum sorriso, algum par de penas ou algum balançar de cabelos iam o fazer brilhar os olhos, sacudir a alma, alimentar os escritos. Mas hoje não.

Hoje o menino caminhou entre seus escritos mais absurdos, mas não se deixou sujar da sangue. Ele sentia cada palavra que um dia disse, mas não chorava nenhuma delas. Ele só carregava no rosto um sorriso tranquilo. Não era desamor, era respiro. Ele estava feliz.

A solidão o acompanhou de mãos dadas e olhou profundamente dentro de seus olhos escuros. Ele não teve medo dela. Ele apenas sorriu.

Malditos os dizeres de alguns poetas que só viram beleza nas tristezas que escreveram. Não é só delas que nascem as intensidades. Ele era a intensidade! Mas também sabia sorrir feliz ao final de cada ciclo, depois que o coração parava de doer.

Naquele dia o poeta sabia que tinha pegado o coração no bolso e colocado no em seu lugar, e naquela noite de inverno ele estava quentinho, abrigado no peito.

Acordou no meio da noite, sem susto. Pegou a caneta e o papel para falar sobre a solitude que chagava de mansinho e cuidava dele, sabendo que talvez ela nem dure. Afinal, ele era o menino poeta, e meninos poetas nasceram para amar.

  

segunda-feira, 21 de julho de 2025

A tempestade.

Uma tempestade invade os meus olhos no fim de um dia banal. Não leve a mal as palavras desse poeta ambíguo. Ele tem nossos olhos as cores de todas as estações.

Perdido nos seus próprios ditos, malditos amigos do medo de amar mais do que pode.

Os batimentos acelerados, o sangue pulsando tão rápido, a ponto de machucar o coração.

Lembrou dos olhos dela, era tudo! Um pouco oblíqua, uma tanta cigana, dissimulada às vezes. Era tudo o que ele queria.

O corpo dela conversava tão bem com o dele. O menino nú, não só das vestes mas de si próprio. Tudo dela.

Deixou para escrever outro e outro poema quando o dia nascer. Mas não se levantou para ver o sol, o sol o lembrava o sorriso dela. Mas nas noites frias também não escreveu.

Em arrepios de medo febril, dormiu no canto da cama, feito criança com medo, guardando o segredo de tentar não amar. Mas ele amou.

Uma tempestade se fez na minha alma, esperando o nascer do sol. Mas eu não acordei para contemplar.

quinta-feira, 3 de julho de 2025

Fale sobre o amor.

Me fale de amor sob as estrelas desse céu nublado, e mesmo que eu entenda tudo errado. Tenha paciência comigo. Eu também quero aprender!

Me deixe contar quantas vezes você me olhou e repentinamente desviou o olhar para que eu não fosse capaz de ver mais do que você queria dizer. Mas me diga, quantos amores fizeram com que você fosse você?

Feche os olhos no meio das frases e sorria, sorria de novo o amor. Já que ele é feito de você!

Me traga nos sonhos mais saudosos, e na imensa vontade de entender o amor eu lhe pergunto. Por que o amor é tão feito de você?

Seria só poesia? Obra banal de um artista vão. Meus textos pelo chão, meus poemas reduzidos a pó. Eu, o menino "escrevedor" de sonhos vagos e amores banais. Por que me amaste mais? Por que?

Todos os dias vestindo cores sóbrias em combinações divertidas, sempre um pouco de sorriso no pesar. Sempre doendo um pouco com um sorriso de canto de lábio. Sempre! Eu caminho por ai.

Não tente me dizer que amor também não é feito de mim ou que eu não sou feito de amor. Às vezes até nos confundimos, parados em alguma esquina esperando o sinal abrir, nos olhamos nos olhos e seguimos. Eu e o amor.

Todos os dias com os olhos fixos no espelho há um sorriso meio lágrima, um canto meu tão seu. O copo pela metade, outra garrafa cheia. Eu me recuso a levantar da mesa até o sol se por. Vai que talvez eu entenda o que você quer dizer, meu amor!

Me fale de amor sob a luz desse dia azul, sem que as nuvens invadam o céu e comece a chover lágrimas, sem que comece a chover lastimas.Me fale mais sobre o amor. 

quinta-feira, 5 de junho de 2025

Mais uma vez.

 E no final da noite, tocou a mesma canção. Eu a sabia de cor, embora sempre me surpreendesse com suas nuances. Eu estava devastado pela vida, e só queria deixá-la. 

Talvez um veneno, talvez um novo amor. Ambos me matariam, cada um a seu jeito.

Eu ouvi a mesma canção, e ela me falava sobre algo que ainda me deixava petrificado. Eram tantas as feridas que cobriam o corpo de sangue, e eu parado, ali, no mesmo lugar não pensava em nada. Apenas sentia a dor de estar ainda vivo.

Cambaleei até a mesa e comecei a escrever outro poema, com o sangue que jorrava de mim. Eu não estava certo de que aquilo era meu último poema, mas rezava para ser.

Eu, com a dor insuportável de estar vivo, as palavras com a dor insuportável de estarem vivas para sempre. Nós nos completávamos.

E comecei a escrever, talvez apavorado pela dor usei de palavras maçantes e muito diretas. Era quase despedida. Eu estava partido e partia a cada instante. 

Eu me despedia dela, enquanto não era ela quem me matava, mas sim a própria vida.

Eu pulsava ainda, por sei lá quanto tempo pulsaria. E sempre que fosse mais forte menos tempo, mais sangue. Mais eu ia embora.

E eu parti.

O poeta partiu mais uma vez. E com o coração em mãos o colocou no bolso, acordou e foi viver mais um dia. Foi morrer um pouco mais.